Por décadas, as indústrias tradicionais foram o motor do desenvolvimento do Brasil. Siderúrgicas, portos, fábricas, agroindústrias e empresas de energia criaram empregos, estruturaram cidades e sustentaram o crescimento nacional. Mas o que funcionou no século XX já não garante competitividade no século XXI.
Hoje, estamos diante de uma transição histórica: a nova economia, sustentada pela inteligência artificial, pela digitalização e por ecossistemas locais, está transformando a forma como as indústrias operam e geram valor.
O Desafio das Indústrias Tradicionais
De acordo com a CNI (2025), apenas 18% das indústrias brasileiras estão em estágio avançado de digitalização. Isso significa que a grande maioria ainda opera em modelos lineares, dependentes de eficiência operacional e pouco conectados a dados.
Enquanto isso, benchmarks globais mostram o contraste:
- O Porto de Roterdã (Holanda) reduziu em 20% o tempo de embarque com IA preditiva, economizando € 80 milhões por ano.
- O setor automotivo alemão utiliza digital twins para simular linhas de produção inteiras, reduzindo falhas em até 30%.
- O agronegócio norte-americano aumentou em 15% a produtividade por hectare com sensores IoT e análise de dados em tempo real (USDA, 2024).
Esses exemplos deixam claro que a transformação não é opcional — é inevitável.
Indústria 5.0: além da automação, a humanização
Se a Indústria 4.0 foi marcada pela automação e integração digital, a Indústria 5.0 recoloca o ser humano no centro, em sinergia com máquinas inteligentes.
Segundo a União Europeia (2023), ela se apoia em três dimensões estratégicas:
- Sustentabilidade – redução da pegada ambiental e adoção de circularidade.
- Resiliência – cadeias de produção mais adaptáveis a crises globais.
- Centralidade humana – trabalhadores lado a lado com IA e robôs colaborativos (cobots).
No Brasil, isso já aparece em setores estratégicos:
- Automotivo (SP/PR): montadoras nacionais implantaram IA em manutenção preditiva, aumentando em 12% a vida útil de equipamentos.
- Siderurgia (MG): digital twins ajudam a prever deformações em processos de laminação, reduzindo desperdícios em 18%.
- Agroindústria (MS/GO): cooperativas de grãos usam drones com IA para mapear plantações, economizando 25% em insumos.
Desenvolvimento Local como Estratégia Industrial
A nova economia mostra que a força industrial não depende apenas de grandes polos, mas de territórios capazes de alinhar vocações locais com tecnologia global.
- Campina Grande (PB): referência em semicondutores, exporta soluções digitais para mais de 30 países.
- Joinville e Vale Europeu (SC): fábricas digitalizadas têm produtividade 35% superior à média nacional.
- Fortaleza (CE): o Complexo do Pecém atrai investimentos em hidrogênio verde, reposicionando a matriz energética.
- São Luís (MA): logística portuária com IA e energia renovável posiciona a cidade como polo estratégico do Norte/Nordeste.
Indústrias do Maranhão: logística, energia e bioeconomia
O Maranhão reúne ativos estratégicos únicos para aplicar os princípios da Indústria 5.0:
- Siderurgia e Metalurgia: Açailândia abriga produtores de ferro-gusa como a Gusa Nordeste, ligados ao corredor logístico da Vale. A aplicação de IA pode otimizar fornos e reduzir emissões.
- Celulose e Papel: a Suzano Papel e Celulose em Imperatriz produz mais de 1,5 milhão de toneladas de celulose/ano e já explora práticas de economia circular com aproveitamento de resíduos para bioenergia.
- Energia e Combustíveis: operações da Petrobras e distribuidoras no entorno do Itaqui fazem do Maranhão um hub de combustíveis. Projetos de solar e eólica crescem e podem tornar o estado referência energética.
- Agroindústria: a região de Balsas é um dos maiores polos de grãos do país. IA e rastreabilidade são diferenciais para atender mercados externos.
- Alumínio e Mineração: a Alumar (Alcoa + parceiros) em São Luís é um dos maiores complexos de alumínio da América Latina. A adoção de energia limpa pode ampliar competitividade.
- Construção Naval e Offshore: o estaleiro no Itaqui pode se reposicionar para atender cadeias de offshore e energias renováveis.
- Alimentos e Bebidas: indústrias locais, de frigoríficos a fábricas de cachaça, podem usar IA para personalização de portfólio e expansão para fora do estado.
📌 Síntese: O Maranhão pode se tornar um laboratório vivo da Indústria 5.0, conectando porto, agroindústria, siderurgia, mineração e energia limpa a um modelo de desenvolvimento local sustentável e globalmente competitivo.
O Caminho à Frente
Para as indústrias brasileiras — e especialmente as do Maranhão — três movimentos são críticos:
- Migrar da eficiência para a inteligência – usar IA não apenas para reduzir custos, mas para criar novos modelos de receita.
- Atuar como âncora em ecossistemas locais – fomentar startups, fornecedores e talentos regionais.
- Assumir protagonismo em impacto global – reposicionar o Brasil como exportador de soluções digitais ligadas às suas cadeias fortes (bioeconomia, energia, logística).
💡 Reflexão final: A nova economia e a Indústria 5.0 não eliminam as indústrias tradicionais — elas as reinventam. O futuro das fábricas, portos e campos do Brasil depende da capacidade de integrar inteligência artificial, redes locais e visão de longo prazo. O jogo não é mais apenas produzir mais rápido, mas produzir de forma mais inteligente, humana e sustentável.
📌 Fontes de referência
- União Europeia (2023). Industry 5.0 Policy Brief.
- OCDE (2023). Innovation and Industrial Development Report.
- CNI (2025). Índice de Inovação dos Estados. Observatório da Indústria.
- Sebrae (2025). Startups Report – Panorama Nacional.
- ENAP (2024). Índice de Cidades Empreendedoras.
- Porto Digital (2024). Relatório Anual de Impacto Econômico.
- BloombergNEF (2024). Global ESG Investment Trends.
- Embrapa (2024). Relatórios de Inovação no Agronegócio.
- Anfavea (2024). Transformação Digital na Indústria Automotiva.
- Roterdã Port Authority (2023). AI in Port Logistics Benchmark.
- USDA (2024). Agricultural AI & Data Report.
- Relatórios públicos da Suzano, Alumar, Vale e Petrobras (2023-2024).
